O Sonho II
Por José Calvino
Por José Calvino
Luiz Carlos ao regressar do trem da tarde, durante o percurso de
Recife à sua cidade natal, sentado num dos bancos de encosto-móvel-de-vime,
observava pela janela o velho gasômetro, o parque do Exército e a favela do
Coque. A “Maria Fumaça” arrotava faíscas de sua fornalha, caindo
nos olhos dos que se atrevessem a por a cabeça do lado de fora, geralmente as
crianças. A loco apitava sucessivamente ao passar antes dos cruzamentos de
automóveis, soltando fumaça em desenhos, através de sua chaminé, deixando pela
linha à fora um cheiro saudoso do carvão-de-pedra. Desfilavam os postes com os
seus fios telegráficos e as placas em vermelho, com letras brancas, advertindo:
P.N. APITE PARE OLHE-ESCUTE.
O trem já passava da
estação de Lacerda. Luiz dormia. Inicialmente, sonhou sendo preso como
comunista, por ter participado de um comício de Prestes, conhecido como “O
Cavaleiro da Esperança”. Este sonho era como um aviso profético, que
futuramente haveria de se realizar. O local esquisito era como o “Buque” da
Chefatura de Polícia. Ora parecia com um quartel da Meganha, onde fora
humilhado, colocado na solitária. Aquele sonho parecia real! No isolamento via
elementos, da própria polícia, presos sendo maltratados e marginalizados pelos
próprios companheiros. Ouvia dizerem aos policiais-presos:
- Vão ser excluídos e
entregues à Polícia Civil, transferidos para a Casa de Detenção junto com esse
civil safado!
A
promiscuidade com os presos de diferentes classes era ridícula. À proporção em
que sonhava já se sentia na Casa de Detenção do Recife com seu companheiro
José, taxado como pivô das greves e passeatas dos ferroviários, preso como
comunista por contrariar as leis...
- Isto é uma loucura, eles só sabem fazer leis e não dão os
nossos direitos. Me matem!
- Luiz Carlos ultimamente chegava em casa sempre embriagado. Já
trêmulo, vocês não viram? Não tinha mais forças. Sua morte caminhava lenta. E o
futuro carnaval que pensava brincar à sua maneira, foi a do “suicídio lento”, sufocando-se
na bebida e no fumo! A meu ver as bebidas alcoólicas deveriam ser com prescrição médica como são com os medicamentos
que um paciente ou animal deve tomar
assistido e orientado por psicólogos(as) e psiquiatras, com uma rigorosa
fiscalização da prescrição. – disse Jane advogada dos
ferroviários.
Finalizando esta crônica, até porque como escritor é meu dever transmitir aos
leitores (principalmente aos jovens) as minhas experiências, apresento o poema
que está sendo bem comentado, sobre esta triste realidade:
O que eu quero lhe informar
Sai
de casa para beber e fumar.
É melhor
sempre olhar pro mar,
Também é bom
amar,
Fazer o bem e
chamar
E à risca do
povo aclamar
Que ao de tudo
de bom provar
Algumas coisas
só fazem é prejudicar.
Eu quero
apenas lhes informar:
A bebida faz
embebedar,
O fumo faz
poluir o ar
E ambos só
fazem drogar
Ou morrer mais
depressa, continuar...
Nota – Alguns trechos extraídos do teatro “Trem da Vida” e do
livro “O ferroviário” – Cap. IV, pp. 39-43. Ed. 1980.
Publicado hoje no Literário: Um blog que pensa - pbondaczuk.blogspot.com/
ResponderExcluirColuna: "Observações e Reminiscências"