sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Fiteiro Cultural




Fiteiro Cultural

* Por José Calvino


Para não ser redundante com o Fiteiro Cultural IV,  tento agora retratar o problema do autor independente e a  situação sócio-econômico e financeira do(a) escritor(a), poeta. Saí  pelo Brasil afora e vendi todos os meus livros. Infelizmente, o difícil é encontrá-los nas livrarias. Eu já comprei o meu próprio livro no Sebo do Recife por dois reais. Para a nossa decepção, praticamente não existe mais o Sebo, porque não há mais o objetivo de vender livros usados. Muitos partiram para vendas de material escolar, apesar de terem a “venda proibida” (mais baratos do que nas livrarias), alguns vendem material didaticamente não recomendável. Uma pena.

O nosso povo não tem o hábito de ler, por isso os editores acusaram à Câmara Brasileira do Livro como uma farsa os números de livros vendidos na 14ª  Bienal do Livro em São Paulo. Para se ter uma idéia, eu pertenci a um grupo de poetas (a maioria não são poetas, nem tampouco leitores!) Por que eu digo isso? Ao convidar para prestigiar umas colegas do grupo, ninguém foi à livraria. Se limitaram a dizer: “Ela merece, Cal!”

Nossos autores não têm espaço. As  Feiras e Bienais do Livro as editoras não divulgam.  É muita conversa fiada. Foi por isso que lá no sebo, haviam pregado à porta do sebista  Melquisedeck um aviso de um desembargador-repentista, doutor Manoel Rafael Neto, que dizia assim: “Amigo Melquisedeck / Deixo-lhe agora um recado / Um tanto desaforado / Como se fosse a um moleque / Nem fiado nem por cheque / Venda meu livro por mil / Se alguém usar desse ardil / Vai haver muita desgraça / Quem quiser livro de graça / Peça a puta que pariu.” Em resumo, me veio à memória, quando lancei o teatro Trem & Trens,  o título seria  O Trem, mas aconteceu o seguinte: “Amigo Cal, eu li o seu livro. Perguntei: “Qual deles, Amigo?“ -  “O trem e...     
Ora, eu só tinha três títulos publicados: O Ferroviário, O Grande Comandante e o Cristo Mulato. “Obrigado, amigo!”. Foi quando  surgiu Trem & Trens – Rio de Janeiro 1982. Muitos diziam: “Parabéns José Calvalcante”, nós sabemos que é Cavalcante, ou Calvino?

Em 1991, o pessoal já perguntava:“Você tem Zélia, Uma Paixão?” biografia autorizada de Zélia Cardoso, então Ministra da Fazenda no governo Collor. Os escândalos em torno de sua vida privada e sua saída do governo foram motivo de grande repercussão entre os brasileiros, e é isso que o povo gosta. Paulo Coelho, Jô Soares eram  os mais bem procurados, então eu ironicamente dizia: Que sorte, estou com uma Komby cheia, vou buscar! Automaticamente diziam: “Hoje, não!, hoje, não!” No ano passado fui à livraria Cultura (Recife), a fim de conseguir o livro do escritor e editor do Literário Pedro Bondaczuk.  A moça da livraria me informou simplesmente que o autor não estava cadastrado, nesse caso não poderia fazer o pedido de compra . Na semana passada, outra moça disse que só falta a editora agilizar o envio!!! Aproveitando o ensejo, perguntei se havia algum livro cadastrado  do José Calvino. Um dos funcionários para mostrar que sabe os nomes dos escritores famosos, disse: “Não é  Ítalo Calvino, não?” Com o escritor e colunista do Literário Urariano, quando perguntado, o mesmo rapaz: “Não é Ariano, não?”, e assim vai...

Se me permitem,  finalizo rendendo culto a um monumento ao livro, como Belmiro Braga diria: “Um livro aberto, parece uma ave que quer voar. E, quem lê, reza uma prece ao saber. Santo de Altar.”

* Escritor, poeta e teatrólogo

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