sábado, 5 de abril de 2014

Beco da Fome II




Beco da Fome II

Por José Calvino



Miguel Rodrigo estava bêbado no “Beco da Fome”, sentado à mesa do botequim ainda aberto, eram seis e meia da manhã, um reflexo da luz do sol batia no seu rosto. Um pirralho apanhou uma cédula de dez mil-réis que caíra do seu bolso, e falou:

- Meu velho, olha o seu dinheiro, caiu!
- ...

Miguel Rodrigo agradece com gesto de cabeça e faz menção com o dedo indicador da mão direita na palma da mão esquerda pedindo tempo.
Dois policiais fardados que passavam pelo beco, um deles deu um cascudo no pirralho, que revoltado disse:
- Não sou ladrão, tá pensando o quê?
- Esse filme já passou! – disse um dos policiais militares.

(...)

Nas proximidades do Beco da Fome, na 7 de Setembro, Azambujanra, com o seu amigo, foram à Livro Sete. Estudantes, intelectuais... conversavam sentados num dos bancos de madeira. A poetisa Poeta levanta-se do banco e abraça Azambujanra demoradamente. Eles se beijam à la... E o Vento Levou, e se retiram da frente da livraria. Já eram sete e meia da noite a livraria estava fechando as suas portas, quando um grupo de ‘crentes’ chegaram pregando o evangelho.
O seu amigo ficou ouvindo as pregações dos evangélicos. Enquanto isso, o casal de poetas decidiu tomar uns drinques no Beco da Fome.
Ouvia-se Aquarela do Recife:

Recife das pontes e dos arranha-céus
Cortados de rios à beira mar
És uma planície com teus palmeirais
E tuas igrejas tradicionais

Recife da praia de Boa Viagem
Os teus jangadeiros, lá fora, a pescar
O vento soprando os teus coqueirais
Divina paisagem em noites de luar

Vê é bom se vê
Recife não pára, somente a crescer
Vê como é bom se vê
Milhões de habitantes no Recife a correr
Nosso Recife tão querido
Teu carnaval não tem igual
Sejam bem-vindos ao Recife
Para conhecer  a beleza natural

Vê tem bumba-meu-boi
Vê aqui tem xangô...
Vê a terra do frevo,
Tem caboclinhos
Tem maracatu
São coisas deste teu folclore
E alguns pregões vou cantar:
Chora, menino, pra comprar pitomba
Mangaba, caju e araçá
Pirulito de “mé de abeia”
Mel novo de engenho e munguzá
Caranguejo, uçá de maré do areal
Tudo isto é Recife
A terceira capital.

Numa verdadeira miscelânea, ouvia-se baião, xote, samba-rock, forró-pé-de-serra, poesia...


Nota – Extraído do livro "Trem Fantasma"
(Contos poéticos & humorísticos), pp.15-20 –
ed. 2005.






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