Literatura & Carnaval
Por José Calvino
Na melhor das hipóteses, Azambujanra, este ano, não estava a fim de brincar o carnaval como sempre brincou. No sábado de Zé Pereira começava brincando no maracatu Barco Virado e ia, até a quarta-feira de cinzas, no Bacalhau do Batata em Olinda.
Os prazeres da vida, fazer o passo do frevo pernambucano, sambar...
Azambujanra lia um livro prazeroso, no qual Recife naquele momento parecia estar apenas na sua memória. Mas, estava expresso: “Aos domingos Miguel Rodrigo e Edilza iam assistir aos pequenos hidroplanos da Condor e da Panair amerissarem-se sobre as águas da bacia do Cais do Chupa. Ora se arrojavam, ora decolavam.”
Azambujanra, num dos carnavais saiu protestando pelas ruas do Recife fantasiado contra o “auxílio paletó” para os políticos.
- É muita saúde, o homem dança que só...
Azambujanra conheceu pessoalmente o espanhol de Sevilha Miguel Rodrigo e Edilza que era fã de Rodolfo Valentino e não perdia uma sessão no Glória, quando passava filmes de sucesso, principalmente “Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse”, quando Valentino- no papel de um gaúcho argentino – dançava um tango com a atriz Beatrice Dominguez. Desta, Miguel Rodrigo era também seu fã.
Miguel Rodrigo e Edilza dançavam muito bem e ele, principalmente, era o melhor dançarino do Recife. Era a cópia fiel do ator Valentino... A inveja dos dançarinos era grande quando os viam dançando tango, bolero, valsa, etc, nos salões do Batutas de São José, nas Pás, Prato Misterioso, Amantes das Flores... eles “fechavam”...
Enquanto lia, notavam-se as lembranças estampadas em sua face: Clube de Frevo “Estou Aí” do Córrego do Euclides – Casa Amarela, tocando a canção dos marinheiros brasileiros: “Qual cisne branco que em noite de lua/ vai navegando no mar azul...” e em seguida “Vassourinhas”. É quando Miguel Rodrigo e Edilza entram no frevo-de-rua-rasgado no meio da multidão...Troça carnavalesca e o maracatu de Nazaré, com seus personagens: Porta-estandarte, mestre, rei, rainha, Mateus, catirina, baianas, menina da boneca, bandeiristas, burra, caçadores e“cabocolinhos”, com as cabeças adornadas de fitas coloridas, óculos escuros, cravo-flor na boca, lanças enfeitadas com fitas e roupas espelhadas com chocalhos nas costas, que chamavam a atenção de todos. O Clube Carnavalesco“Toureiros de Santo Antônio”, “Até meio-dia” (de Casa Amarela), “Cavaleiro do Luar”, com o homem morcego (de Paudalho) , “Urso pé-de-lã...
- O urso quer cagar!
- A laursa é de Portugal
Quer brincar o Carnaval...
- Este urso veio de Portugal
Tem os culhões grandes
Quer brincar o Carnaval...
- Você já disse aos foliões que não vai brincar o carnaval este ano?
- Não, mas vou terminar de ler o meu livro.
Nota – Alguns trechos extraídos do livro “O Pai do Chupa”, ed. do autor.